segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Uma gota do teu veneno bastaria

Já pensei muitas vezes na antiga sensação de vida crua que senti há um tempo... Lembro de como, aos poucos, meu coração era congelado, e a vida quase escapava de mim, então, quando apenas um fio de esperança me restava, ela, gerada em algum inferno bem disfarçado para estar comigo a vida toda, trazia chama incontida à minha existência.
Quando eu voltava do meu pesadelo gelado, via aqueles olhos pequenos dentro dos meus, como se vasculhassem minha alma, sem nada dizer. E foi sempre assim, ela não me dizia muito, e quando dizia eu não acreditava, por tantos motivos, por tantos medos. Houve noites, que, em sonhos desesperados, perguntei a ela como era possível que não pudesse tocar minha alma, como podia não senti-la, se era minha vontade e a dela também. Bom mesmo era a proximidade de nossos corpos, aquilo sim era real, aquilo sim era viver. Um dia sem tocá-la inquietava-me, e não era só a mim. É minha única certeza, ela sentia o mesmo que eu.
Mas, por alguns desconhecidos de almas rasas e facilmente atingíveis, nas festas que nunca despertaram minha atenção, ela se deixava cegar e não me enxergava mais.
Decidi por outros corpos também, querendo que olhos diferentes vasculhassem minha alma. Encontrei quem me dissesse o que ela nunca falou, encontrei companhias pra uma vida inteira, talvez, mas minhas veias não saltavam na pele, como quando estávamos juntas, e logo meu coração reclamava as friagens que viriam.
Sempre voltamos uma para a outra, depois de juntas para o mundo ver, fomos uma da outra escondidas dele, andando de mãos dadas por ruas desconhecidas, ela mantinha pulsando meu coração naqueles frios incalculáveis, eu, tentava roubá-la do mundo, cada vez mais convencida de que cada um de seus demônios era vital para mim.
Como a amei, meu deus, como a amei! Egoísta, pedi aos céus que na terra só restássemos nós, e nos meus piores estados, desejei minha própria morte, para, quem sabe, matá-la em mim. Eu não sabia que ninguém no céu tinha nada a ver com o que sentíamos.
Em minha contradição, quis arrancá-la da minha vida, porém, entendi que não sobreviveria sem um pedaço de mim... Consegui controlar o turbilhão latente que ela representa. Ou tenho tentado, ao longo dos anos.
Quando pressinto o pensamento nela, logo fecho os olhos e tento acreditar em alguma magia capaz de me fazer sentir os extremos outra vez, sem vivê-los. Anseio o gelo e o fogo que nunca chegam.



Daniele Rodales nasceu em Arroio Grande/RS, em 1991, cidade onde mora até hoje. É graduanda em Letras e escreve pelos cotovelos. Veicula alguns escritos no blog http://despertarsecreto.blogspot.com.br/. Participa do Círculo dos poetas e escritores da Unipampa.

Um comentário:

  1. Da leitura deste texto da Dani brotou um poema chamado "Pós":

    Antes de partires
    antes quando da chegada
    Antes de saber que tu virias
    antes, quase, de já não voltares

    Tardou de existir há tempos
    o que só agora se anuncia feito.
    Matéria do intervalo
    entre o que esteve à vista
    e o que se perdeu.

    Teu coração calou-me a boca
    tarde demais
    Não era mais de amor que se falava
    Que o amor mal dá tempo
    Que o amor
    quando a gente vê
    já era.

    Um abraço, Dani!

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